A trajetória do Centro de Ciências, Letras e Artes está diretamente associada a momentos e personagens relevantes da história de Campinas e do Brasil. Santos Dumont e Rui Barbosa são apenas alguns dos nomes vinculados ao CCLA.
Preservar a memória e a história sempre foi uma preocupação central do CCLA, o que pode ser confirmado pelo seu empenho em sediar dois museus, os dedicados a Carlos Gomes e a Campos Salles.
A ativa participação, no seu corpo de colaboradores, de importantes historiadores, torna o CCLA como um dos espaços privilegiados para o debate de aspectos e momentos significativos para a história local e nacional. A volumosa biblioteca tem sido fonte para muitos estudos e pesquisas de caráter histórico.

Crédito Foto: Martinho Caires
CCLA e memória de Campinas
Três episódios marcantes da história de Campinas merecem atenção especial do CCLA: o Combate de Venda Grande, a Febre Amarela e a Revolução Constitucionalista de 1932.
Combate da Venda Grande – Em 5 de fevereiro de 1842 a Vila de São Carlos, segundo nome de Campinas, foi elevada à condição de cidade. Era o reconhecimento a um centro urbano em crescimento, e que começava a sentir os efeitos da economia do café. E logo a cidade foi um dos palcos mais sangrentos da Revolução Liberal liderada pelo padre Antônio Diogo Feijó, que morou e trabalhou em Campinas (foi um dos primeiros professores locais no comecinho do século 19). O movimento era uma reação ao golpe de Estado que tinha dissolvido a Câmara dos Deputados, onde estava se formando uma forte oposição ao Império. O golpe foi praticado pelo Partido Conservador, a quem o presidente da província, o Barão de Monte Alegre, era ligado. Em 15 de maio de 1842 Sorocaba foi declarada pelos revoltosos como capital da província, sendo Rafael Tobias de Aguiar escolhido como presidente interino. Tobias de Aguiar tinha sido presidente da província de 1831 a 1835 e de 1840 a 1841.
A repressão veio em seguida, pelas tropas comandadas por Luis Alves de Lima e Silva, ainda Barão de Caxias. Um grupo de campineiros, liderado por Antônio Manuel Teixeira, se armou para tentar resistir ao avanço das forças imperiais, se reunindo no Engenho da Lagoa, ou Venda Grande, nas proximidades do atual Campo dos Amarais. O Combate da Venda Grande aconteceu a 7 de junho de 1842. Seis revoltosos morreram. A Revolução foi sufocada e os líderes, presos. Hoje existe um monumento, no canteiro central da Av. Dario Freire Meireles, em frente ao nº 689, lembrando o Combate. A Rua Boaventura do Amaral, no centro da cidade, é homenagem a um dos mortos em Venda Grande. Todos os anos o CCLA presta homenagem aos mortos no Combate da Venda Grande. Existe no Centro um Grupo Pró-Memória Combate da Venda Grande.
Febre Amarela – Entre 1889 e 1897 Campinas passou por vários surtos de Febre Amarela, que devastaram a cidade. Foi enorme o êxodo dos moradores, sobretudo no surto de 1889. Quem podia deixava a cidade, que ficou deserta nos momentos mais críticos. Ao final a febre amarela deixou 2.500 mortos, ou cerca de 6% da população local na época – proporcionalmente, algo como 60 mil pessoas na atual população de Campinas.
Vários hospitais se destacaram durante a epidemia, como a Santa Casa de Misericórdia, inaugurada em 1o de outubro de 1876. Também destacou-se o hospital do Círculo Italiano (atual Casa de Saúde), inaugurado a 2 de maio de 1886. O projeto arquitetônico do hospital do Círculo Italiano foi assinado por Francisco de Paula Ramos de Azevedo, as obras ficaram por conta do engenheiro Samuel Malfatti. Durante a febre amarela, o hospital do Círculo manteve uma enfermaria de emergência para atender aos doentes.
Foi instalado na cidade um verdadeiro “estado de sítio sanitário”, durante o primeiro e mais grave surto, em 1889. Até mesmo médicos residentes em Campinas preferiram deixar a cidade. Ficaram entretanto alguns, como Ângelo Simões (um dos fundadores do Centro de Ciências, Letras e Artes), Valentim José da Silveira Lopes (que tinha apontado casos de febre amarela em 1876), Antônio Alves do Banho e João Guilherme da Costa Aguiar, o ituano que dirigiu a enfermaria do Círculo Italiano durante os meses mais críticos da doença – março e abril de 1889 – e morreu vítima da enfermidade que combatia, a 19 de maio daquele ano.
Por ordem da Câmara Municipal, presidida por José Paulino Nogueira, a farmácia do vereador Otto Langaard distribuiu gratuitamente remédios aos carentes, vítimas preferenciais da epidemia, uma vez que não conseguiam em geral fugir para outras cidades. Também por solicitação da Câmara, o governo provincial enviou médicos e recursos materiais para Campinas.
A mobilização foi também grande na própria capital do Império. Foi particularmente expressiva a iniciativa dos jornais do Rio de Janeiro, que se empenharam na promoção de vários eventos, com renda totalmente destinada às vítimas e ao combate à febre amarela em Campinas. A mobilização dos jornais do Rio de Janeiro seria reconhecida anos depois, com a denominação dada à praça do Centro de Convivência Cultural, de Imprensa Fluminense.
Várias instituições foram criadas para atender a população pobre durante a febre amarela. Alcançou especial projeção o trabalho da Sociedade Protetora dos Pobres, criada a 7 de abril de 1889, em uma assembleia realizada na Matriz Nova, atual Catedral de Campinas. A 18 de março de 1889 nasceu a Cruz Verde, por um grupo de italianos integrado, entre outros, por Alfredo Carneiro, Hugo Barsotti, Fernando Balletero, Francesco Fachini, Hugo Rizzi, Prudêncio de Miranda, Benjamin Taglietti, Luís Galgano e Pedro Semmi, que foram escolhidos dirigentes da entidade. A Cruz Verde foi criada e funcionava no prédio do Círculo Italiano.
As marcas da Febre Amarela são sentidas até hoje. A vocação solidária existente em Campinas e o esforço pelo tratamento integral dos esgotos urbanos são frutos do trauma provocado pela epidemia.
Revolução Constitucionalista de 1932 – Em novembro de 1930 Getúlio Vargas chegava ao poder após um golpe de Estado, mas prometendo que iria instalar uma Assembleia Nacional Constituinte logo em seguida. Não cumpriu a promessa, o que motivou forte mobilização, sobretudo no estado de São Paulo.
Os ânimos ficaram ainda mais acirrados com a morte, a 23 de maio de 1932, de quatro jovens que participavam de um ato pró-Constituinte em São Paulo. No dia 9 de julho, tropas a 2ª Região Militar e da Força Pública de São Paulo, lideradas por Euclides Figueiredo e Isidoro Dias Lopes, se declararam em conflito com o governo federal. No dia 10 o interventor Pedro de Toledo se declarou favorável ao movimento e foi proclamado governador de São Paulo. No dia seguinte o general Bertoldo Klinger chegaria a São Paulo para comandar o movimento armado contra Vargas, que se estenderia até 2 de outubro, quando Klinger se rendeu.
A Revolução Constitucionalista mobilizou Campinas, assim como todo estado, mas feriu a alma da cidade, com episódios como o bombardeio por um “vermelhinho”, avião dos comandados de Getúlio. O bombardeio aconteceu a 18 de setembro e levou à morte do menino Aldo Chiorato, 9 anos, nas proximidades do bar Mercadinho da estação ferroviária da Companhia Paulista – onde hoje funciona a Estação Cultura.
O movimento deixou marcas importantes no estado, tendo sido fundamental, por exemplo, para impulsionar a criação da Universidade de São Paulo. Todos os anos o CCLA participa da cerimônia que relembra a Revolução Constitucionalista, no dia 9 de julho, feriado paulista.